Mulheres que fazem a diferença
A operadora de máquina Josiane e a pedreira Dilma precisaram superar preconceitos para serem aceitas
As mulheres São minoria no mercado de trabalho brasileiro, Representam apenas 43,3%. Em contrapartida são a maioria da população em idade ativa: 52,3%. De maneira geral, elas são preteridas em cargos de liderança. A terceira edição do estudo "Panorama Mulher 2019", ou seja, antes da pandemia, desenvolvido pela consultoria Talenses em parceria com o Insper, mostra isso claramente ao analisar 532 empresas com sede no Brasil, na América do Norte e na Europa. Mulheres ocupam apenas 19% dos cargos de liderança no Brasil. No cargo de presidência, elas são apenas 13%.
Além das disparidades, as mulheres enfrentam as barreiras do preconceito. Com a massificação das redes sociais, os comentários homofóbicos se tornaram mais presentes toda vez que uma mulher se revela vencedora no mercado de trabalho ou para desqualificar aquelas que lutam pela igualdade de gênero. Um exemplo: "Quero ver trocar um pneu". O que poderia soar como ofensa tornou-se, na verdade, um nicho de mercado para algumas mulheres.
Quem vê a palhaça Leleca nos eventos de fim de semana por Gaspar, pode achar que a vida de Josiane Patrícia dos Santos, de 43 anos, é divertir a si e aos outros. Não é bem assim. Durante a semana, ela tem outra profissão: operadora de retroescavadeira do Samae de Gaspar. "Não... isso não era o meu sonho, mas foi a circunstância e a oportunidade que apareceram", conta. Em 2014, Josiane prestou concurso público na Prefeitura e passou. Quando criança, ela recorda que um tio tinha máquinas na propriedade. "Eu vivia naquele meio, por isso acho que já gostava disso, mas não me imaginava trabalhando com uma máquina dessas, porque naquela época eu só brincava de dirigir", relembra.
Ela se diz feliz em representar as mulheres numa profissão totalmente dominada pelos homens. Lamenta que ainda exista preconceito. "Por mais que as pessoas falem em diversidade de gêneros, que não tem preconceito, ele ainda existe. Eu estou bem tranquila com relação ao meu trabalho, porque eu sofri muito preconceito no início até entender porque estava sofrendo este tipo de discriminação, a partir daí não me importei mais se acham feio, o que importa é que estou fazendo o meu trabalho onde sou paga pra isso", observa. Josiane também não se sente poderosa por exercer uma profissão típica masculina e admite que é uma mulher por vezes, frágil e sensível. "Se eu estivesse numa máquina de costura, embora não entenda nada de costura, seria a mesma coisa. Pra mim, o meu trabalho não é melhor ou pior que outro; trabalhei com serviços gerais e não tenho vergonha de dizer, a diferença agora é que eu ganho mais e a responsabilidade é maior porque é um trabalho perigoso", compara.
Ela admite que no começo causou certa estranheza uma mulher na cabine de uma retroescavadeira, mas como é bastante conhecida na cidade pela profissão de palhaça, as pessoas passaram a cumprimentá-la quando a viam nas ruas. "Muitas batem até palmas, principalmente as mulheres que se sentem muito fortes quando me veem operando a retroescavadeira, já os homens dão apenas um sorrisinho, outros chegam a tirar o carro de perto da máquina", diverte-se Josiane.
O Dia da Mulher é muito bacana, embora eu também ache que é preciso também comemorar o dia dos homens, pois sem eles a gente não vive, né?", opina Josiane.
Pedreira
Se para Josiane o começo foi difícil, imagina então para uma servente de pedreiro lá no começo dos anos 1970. Essa foi uma das primeiras profissões da gasparense Dilma Beiler. que também trabalhou na Artex. Hoje, vivendo entre Florianópolis e Gaspar, a simpática senhora, que também gosta de cantar e até gravou CD, diz ter mais de 70 anos, mas prefere não revelar a idade exata. Dilma conta que seus pais só tiveram filhas mulheres. "Daí a gente tinha de fazer também o serviço dos homens, foi aí que eu comecei com os serviços de pedreiro", revela. Ela lembra que o começo foi difícil. "Os homens me viam levantando uma parede ou um muro e já diziam: - vai cair", recorda Dilma, que faz questão de dizer que até hoje nenhuma das suas construções caiu". E não foram poucas as obras que Dilma executou nestes mais de 50 anos de profissão. Aliás, ela ainda está na ativa. Dona de um sítio em Tijucas, ela conta que recentemente construiu um portal na propriedade. Em Gaspar, Dilma ergueu também um conjunto de quitinetes na Rua Adelina Schramm, no Gaspar Grande, e outro imóvel, de dois pisos, batizado de Casa Mil, próximo à Associação Canarinhos. A pedreira também ergueu casas em Navegantes, Florianópolis e Belém-PA, onde foi proprietária de um hotel. Dilma conta que teve alguns professores durante a vida de pedreira. "Foram muitos, não vou lembrar de todos, mas teve Reinaldo Soares, Lauro Simão e Valmor Deschamps. Casada com João Otávio Beiler, o popular Janga, Dilma tem quatro filhos, sete netos e quatro bisnetos. Até o momento nenhum seguiu na profissão.
Leleca
A palhaça Leleca entrou na vida de Josiane faz um bom tempo. "Acho que foi no dia em que eu nasci", brinca. Ela conta que começou com aluguel de brinquedos, ao mesmo tempo ensinou o afilhado a ser palhaço. "Teve um dia que ele não pode ir, daí eu descobri que também era palhaça, hoje nós trabalhamos juntos". Josiane conta que as pessoas se surpreendem quando ficam sabendo que ela tem essas duas profissões, pois são atividades muito distintas. As minhas profissões chamam, imagina eu grávida trabalhando de palhaça ou em cima de uma retroescavadeira, ainda bem que eu já tenho a minha filha", afirma bem-humorada. E foi justamente a criação da filha que lhe deu motivação para encarar a personagem Leleca. "Eu fui mãe solteira muito cedo, eu sabia que precisava de duas profissões para dar mais conforto para a minha filha. Além disso, é um trabalho prazeroso, por mim eu trabalhava só de palhaça". Quando encarna a palhaça Leleca, ela diz que deixa de lado a sua verdadeir a identidade e vivr intensamente aquele momento para as crianças.