Iniciativa é da pesquisadora Giovana Zen, da Universidade Federal da Bahia
FOTOS: RAQUEL BAUER/JM
O município de Ilhota foi escolhido para participar de uma pesquisa que está sendo desenvolvida pela doutora em Educação, Giovana Cristina Zen, professora e pesquisadora da Universidade Federal da Bahia. Ela está fazendo uma investigação sobre as particularidades do processo de aquisição da escrita no português brasileiro, ou seja, o estudo pretende entender como se dá o processo de construção da escrita entre crianças de 5 e 6 anos. Para isso, três unidades de ensino da rede municipal de Ilhota foram escolhidas: a escola José Elias de Oliveira, no bairro Minas; o Centro de Educação Infantil Tia Loli, na localidade de Pedra de Amolar; e o Centro de Educação Infantil Professora Gianna, no Centro.
Giovana mora na Bahia há 30 anos, mas é natural de Blumenau. Ela se formou em pedagogia pela Universidade Regional de Blumenau (Furb), fez também psicopedagogia e tem mestrado e doutorado em Educação, além de pós-doutorado no México com orientação da professora Emília Ferreiro, que é autoridade em assuntos relacionados à alfabetização. “Quando eu morava aqui em Santa Catarina, eu era professora da rede municipal de Blumenau, trabalhei como professora alfabetizadora, trabalhei também na Secretaria de Educação e, atualmente, estou na Universidade Federal da Bahia, como professora da graduação, da pós-graduação e como pesquisadora”, relata.
A metodologia
A pesquisadora explica que a pesquisa teve início em 2019 e tem como referência as contribuições da abordagem construtivista psicogenética. “Agora, nós estamos investigando mais especificamente um determinado momento do processo da aquisição da escrita em que as crianças começam a usar letras pertinentes, ou seja, começam a usar as letras corretas. Nós queremos entender como se dá esse processo, como as crianças começam a usar essas letras, quais as letras elas usam com mais frequência, se elas usam mais as vogais, mais consoantes, que conflitos elas têm, o que elas enfrentam para incorporar na sua escrita essas letras pertinentes”, exemplifica Giovana.
O objetivo é que a pesquisa possa contribuir para discussões de alfabetização no Brasil e de como as crianças aprendem. “É importante produzir um conhecimento que respeite o que as crianças pensam, porque mesmo antes de saberem escrever e ler convencionalmente, elas já pensam muitas coisas sobre a escrita e, muitas vezes, esse processo é atropelado porque ainda temos uma prática pedagógica que não considera o que as crianças pensam. Precisamos avançar nisso, entender cada vez mais como é que as crianças aprendem para que possamos respeitá-las naquilo que elas pensam, naquilo que elas elaboram e para que a gente possa ajudá-las cada vez mais a avançar nesse conhecimento, para que elas possam ser alfabetizadas com sentido, realizando atividades que tenham significado para ela e não atividades mecânicas, repetitivas, que não colaboram com o ingresso nas práticas sociais de leitura e de escrita”, destaca a pesquisadora. Por que a escolha por Ilhota para realizar a pesquisa? Ela conta que a família da mãe é natural de Ilhota, por isso a proximidade e escolha pelo município.
“Em 2019 eu fiz essa pesquisa lá na Bahia, onde eu moro, mas eu precisava diversificar os estados para que os resultados não estejam relacionados às características dialetais de cada Estado, então decidi fazer a pesquisa aqui no Vale do Itajaí, que é onde eu nasci, me criei. Ilhota é o município da família da minha mãe, o sobrenome dela é Maes, é uma família que tem aqui na cidade, além disso, eu fui super bem acolhida pela Secretaria de Educação, logo se disponibilizaram a ajudar, em viabilizar a realização da pesquisa… então foi isso que me trouxe aqui”, conta.
A próxima fase da pesquisa será realizada na Argentina. “Nós vamos realizar essa pesquisa também na Argentina, com crianças usuárias da língua espanhola, porque nós também queremos fazer essa análise, de quais são as particularidades no português brasileiro e quais são as particularidades no espanhol, isso vai nos ajudar a entender melhor como se dá esse processo em cada uma dessas línguas”, antecipa Giovana.
O que o estudo vem apontando?
Com uma lista de nomes de animais, a pesquisadora se senta com a criança e pede que ela escreva, da forma que consegue, o nome dos animais. Todo o processo é filmado e, a partir daí, ela vai fazendo observações e percebendo como cada criança desenvolve a escrita. “É importante esclarecer que eu não estou avaliando as crianças, é uma pesquisa para entender esse processo de construção da escrita e, de fato, pelas escolas por onde eu já passei, existem particularidades nesse processo que são muito interessantes e que podem, inclusive, mudar a forma como a gente entendeu até agora esse processo de construção da escrita”, conta.
Ela exemplifica: “Uma dessas particularidades percebidas é que nesse início do uso de letras pertinentes as crianças fazem uso de consoantes. Até então a gente considerava que as crianças utilizavam mais as vogais e só depois incorporavam as consoantes, mas temos visto que não é bem assim. Mesmo nesse início do uso de letras, as crianças já utilizam consoantes e temos uma hipótese de que isso acontece porque no português brasileiro existe uma diversidade grande de fonemas vocálicos e essa diversidade de fonemas vocálicos podem gerar certa instabilidade. Talvez isso leve as crianças a usarem mais as consoantes, porque elas são mais estáveis. É uma conclusão provisória, a gente vai precisar concluir a pesquisa, analisar todos os dados, fazer o estudo na Argentina, comparar os resultados, para podermos afirmar com mais certeza como se dá esse processo”, explica.
“Nós queremos entender como se dá esse processo, como as crianças começam a usar essas letras, quais as letras elas usam com mais frequência, se elas usam mais as vogais, mais consoantes, que conflitos elas têm.” Giovana Cristina Zen: Professora e pesquisadora da Universidade Federal da Bahia
A supervisora de ensino dos anos iniciais da secretaria de Educação de Ilhota, Elaine Cristina Custódio, explica que Ilhota já desenvolve um caminho de alfabetização que coloca a criança como protagonista. “Nós já participamos de alguns programas junto ao Governo Federal e, atualmente, através da Associação dos Municípios da Região da Foz do Rio Itajaí (Amfri), a gente tem um trabalho voltado para melhorias da educação, que traz o instituto Avisa Lá, onde os nossos coordenadores pedagógicos têm formações, trazem pautas para serem desenvolvidas nas escolas. Esse trabalho de pesquisa vem muito ao encontro com o que a Giovana está nos propondo, de pensar essa escrita tendo a criança como protagonista, isso está dentro da nossa proposta curricular”, destaca.
Elaine conta que as crianças estão muito contentes em participar da pesquisa. “Quando a Giovana fez o primeiro contato, que foi bem antes da visita presencial dela, nós já começamos esse trabalho com as crianças, contando que elas participariam de algo muito importante, que uma pessoa iria vir conhecer a escrita delas, como elas estão pensando, que elas são crianças inteligentes e que têm muito a contribuir, então elas já estavam na expectativa, os pais também já estavam cientes, e eles estão gostando, não temos resistência, pelo contrário, eles se sentem importantes”, relata a supervisora.
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