O colono que percorria 40km para vender farinha

. Ele foi mais um agricultor que conseguiu prosperar no tempo dos engenhos de farinha no Barracão

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Foto: Alexandre Melo/Jornal Metas/Pedro, filho mais velho de Alfredo, mandou fazer um trailer que, por vezes, serve de moradia

Para Alfredo e Rosalina de Oliveira nunca tinha dia ruim. O casal viveu da agricultura boa parte da vida. Mas, seu Alfredo era também um excelente negociante de terras. Ele comprava áreas para plantar arroz. Fez isto até 40 anos de idade. Por fim, comprou uma grande expropriedade no Barracão, próxima aos limites de Gaspar e Brusque. Foi ali que Alfredo e Rosalina decidiram fixar residência e criar seus 13 filhos com os enormes sacrifícios da época. Era o final dos anos 1950 e a infraestrutura no acanhado bairro era precária: energia elétrica só apareceu muitos anos depois e água só de poço artesiano. O casal e os filhos viviam da lavoura de mandioca, principal cultura da época. Seu Alfredo também construiu o seu engenho de farinha, já que praticamente todos os agricultores produziam farinha para vender na região. Foram mais de 20 anos como farinheiro.

Pedro Oliveira, o primogênito, hoje com 72 anos, guarda boas lembranças dos pais. A família era muito religiosa, e foi justamente em uma festa de igreja que Pedro recorda de uma passagem engraçada do pai, sempre muito sério. Pedro conta que seu Alfredo não era muito adepto da bebida alcoolica, mas certo dia foi à festa da padroeira, Nossa Senhora do Rosário, com o seu carro de mola puxado por dois cavalos, aliás, o único que havia no Barracão. "Meu pai decidiu beber naquele dia e passou do limite, acabou entrando com o carro de mola no galpão da festa e virou tudo numa grande confusão. No outro dia, ele foi intimado a ir na delegacia prestar esclarecimentos. Meu pai tomou um grande sermão do delegado. Se ele já não gostava de beber, aquele foi o último dia que fez isto", diverte-se o filho.

Por ser o mais velho, Pedro trabalhou mais tempo na lavoura, mas todos os filhos tiveram que ajudar, pois era uma questão de sobrevivência. "Hoje estamos todos muito bem de vida. Não ficamos ricos, mas levamos vidas confortáveis", revela Pedro.


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O livro escrito por Deize


Ele conta que seu pai instalou a energia elétrica na propriedade no final dos anos 1960. "Até então, o engenho de farinha era tocado a boi, o que exigia muito esforço. "Meu pai comprou uma roda d'água, que não funcionou direito porque a água da lagoa não era suficiente", relata Pedro. Ele também recorda da alimentação. "A gente só comia pão de fubá, o pão de trigo era só nos finais de semana e ainda era uma fatia para cada filho".

A farinha de trigo produzida no engenho era levada em carroça por 40km até Blumenau, onde era entregue para comerciantes. "Meu pai saía as duas horas da madrugada, com 20 sacos de farinha na carroça e retornava às 20h". Pedro acompanhou o pai diversas vezes na viagem, mas a prioriedade era ficar em casa trabalhando. Já com 17 anos, seu Alfredo deixou que ele fizesse a viagem sozinho duas vezes. Nos anos 1970, seu Alfredo comprou uma caminhonete e as coisas melhoraram um pouco, mas Pedro admite que nunca se imaginou vivendo da agricultura.

Certo dia, ele chamou o pai e comunicou que iria trabalhar na Cia Hering. O pai até concordou, mas avisou que Pedro deveria continuar ajudando na lavoura. O filho concordou, mas até o seu casamento, depois ele abandonou definitivamente a lida no campo. Da experiência na indústria, Pedro encontrou a sua vocação: representante comercial. Ele conta que já vendeu muita coisa: de biscoioto a aviamentos. Viajou para diversos lugares do Brasil e acabou incentivando seus outros quatro irmãos homens a também trabalharem com vendas.


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Livro "O Melhor da Vida"/Parte da família Oliveira, com seu Alfredo e Rosalina


A vida de representante comercial, ou caixeiro viajante, como se dizia na época, de cidade em cidade fez de Pedro um homem da estrada. "Eu gosto muito de viajar", admite. Por isso, mesmo depois de aposentado e ter entregue seu último negócio - uma fábrica de gelo em Brusque - para o filho, Pedro voltou a botar o pé na estrada, só que agora para o lazer. Pedro mandou fazer um trailer, que por vezes serve até de residência. Já esteve no Chile e no Ushuaia, o extremo do Continente, e para diversos lugares do Brasil. Pedro só fica triste ao lembrar da perda de uma de suas filhas para um câncer. Deize de Oliveira faleceu há quatro, antes, e durante a luta contra a doença escreveu um livro onde faz relatos emocionantes da sua vida desde a infância até o casamento e os filhos. Evidente que seus pais e avós ganham destaque na autobiografia. Seu alfredo viveu até o começo deste século, morreu aos 84 anos. Já dona Rosalina faleceu alguns anos antes. Antes de morrer, seu Alfredo vendeu as terras para Pedro. Na área, que já foi moradia da família Oliveira, será erguido, em breve, um loteamento. É a nova paisagem do Barracão, que já foi um dia a terra dos engenhos e também dos Oliveiras.