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Lídia ensinou o bê-á-bá a gerações de jovens de Gaspar

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Lídia ensinou o bê-á-bá a gerações  de jovens de Gaspar

Antes de saber ao certo o significado da palavra professora, Lídia Tonioli Marques já sabia que era essa a sua vocação profissional. Com fama de disciplinadora, ela atravessou gerações ensinando o bê-á-bá a milhares de jovens de Gaspar.
Aos 16 anos, Lídia se formou no Estudo Complementar – o equivalente a 6ª série do ensino fundamental. Na época, era o máximo que oferecia o ensino de Gaspar. Os jovens que pretendessem continuar estudando deveriam ir para colégios de Blumenau, e isso nem sempre era possível para as famílias gasparenses. Em 1947, ano em que concluiu os estudos em Gaspar, Lídia recebeu o convite para lecionar – ela sempre foi uma das melhores alunas da turma. A sua mãe, no entanto, a achava muito jovem para enfrentar o desafio de uma sala de aula. No ano seguinte, próximo de completar 17 anos, Lídia decidiu enfim assumir a sua vocação. Com o consentimento da mãe, iniciou na profissão de educadora. “O que é para ser nosso sempre chega”, costuma dizer a professora aposentada.
Lídia nasceu no bairro Gasparinho, mas cresceu na acanhada e distante localidade do Coral das Minas, no bairro Gaspar Grande. Era de família pobre, e desde cedo mostrou inteligência e vontade de aprender. Hoje, aos 77 anos, é um senhora lúcida e disposta, só não lembra, às vezes, o nome das escolas onde lecionou porque muitas mudaram de nome e outras não existem mais. A professora começou a lecionar na Escola Municipal Desvio Estrada Brusque (atual Ervino Venturi), no bairro Margem Esquerda.
Ela permaneceu por mais de 18 anos lecionando no educandário, e desta vez a memória não falha ao lembrar da primeira vez que pisou na sala para ensinar. Embora muito jovem, Lídia foi bem recebida pelos alunos. Casada com o português Fernando da Costa Marques e grávida do primeiro filho, ela recorda que a comunidade construiu uma casa para o casal em frente à escola para que não parasse de lecionar. Essa relação com a comunidade foi sempre muito próxima, e isto até hoje a emociona.
“Hoje, muita coisa mudou”, compara Lídia à época em que era professora. Ela conta que os alunos, com idades entre 7 e 8 anos, entravam na escola sem saber sequer pegar em um lápis. “Alfabetizar não era tarefa fácil, era um enorme desafio”, admite a professora. Sem falsa modéstia, ela afirma que sempre foi muito dedicada ao trabalho. “Estudava até a madrugada para estar bem preparada para o dia seguinte, queria ensinar tudo e sempre mais aos meus alunos”, conta. Lídia lecionou História, Geografia, Matemática, Religião, Ciências e Língua Portuguesa. Admite sua fama de disciplinadora e que muitos alunos a temiam. Os professores usavam varas na sala de aula, e bater nas crianças desobedientes não era nenhuma agressão ou abuso de poder. “A minha intenção e de outros professores era sempre que todos aprendessem e fossem obedientes”, justifica Lídia.

Paixão
Ela fala com saudades do marido, com quem teve três filhos: Neuza, Luís e Fátima. “Era um homem muito trabalhador e honesto”. Fernando era engenheiro e faleceu há 21 anos. Pouco antes de morrer, comprou uma casa e a reformou. É nela que Lídia mora e passa os dias a recordar dos bons tempos em que a sala de aula era a sua grande paixão.

Lídia lecionou para os netos

Lídia lecionou por 28 anos. Em 1974 se aposentou. Chegou a ensinar matemática para alguns de seus sete netos, que seguiram o exemplo dos avós. Hoje, eles estão crescidos e formados médicos e advogados.
Ao falar sobre o passado, Lídia lembra da dificuldade de quando precisava se deslocar ao trabalho de bicicleta ou a pé. Ela recorda do sofrimento e da batalha que enfrentou ao lado do marido para criar e educar os filhos. “Já pensei em escrever um livro sobre a minha vida”, revela a professora. O projeto, no entanto, ainda está na gaveta.
Lídia tem uma vida tranqüila na Rua Itajaí. Aliás, merecida depois de tanto trabalho e dedicação aos jovens. Ela relembra, com nostalgia, os tempos de educadora. É da opinião que o sistema de ensino no Brasil já foi bem mais forte. “As crianças aprendiam mais”, garante.