Há quatro décadas, Hilário Bernardi teve ousadia e criatividade para construir uma minihidrelétrica

Há quatro décadas, Hilário Bernardi teve ousadia e criatividade para construir uma minihidrelétrica

O leitor de histórias em quadrinhos conhece bem um personagem chamado professor Pardal. Em seu laboratório, o inventor cria as mais estranhas engenhocas, algumas dão certo outras provocam grandes confusões. Da ficção para a realidade, Gaspar também tem o seu professor Pardal. Ele atende pelo nome de Hilário Bernardi. A diferença é que a sua invenção deu certo e tem ajudado muitas famílias e empresas a reduzir custos com energia elétrica.

Há 40 anos, Hilário se apaixonou pela área da física relacionada à hidráulica. Apenas com a formação técnica e a autodidática, ele resolveu se aventurar e construir uma pequena hidrelétrica. A ideia foi um sucesso, e a primeira usina está em operação até hoje. Hilário continuou usando o seu gênio inventivo para aperfeiçoar a invenção. A última minihidrelétrica ele instalou, há um ano, na cidade de Lageado Alto.

O invento serve para residências e empresas. Basta que, no terreno, haja água corrente com algum ponto de queda em seu percurso. "Quanto maior a altura da queda, maior a produção de energia", explica Hilário. Se não há desnível no curso da água, a engenhoca até pode ser instalada, mas o custo é maior, pois o ponto de queda precisa ser criado.

O primeiro grande benefício do invento é que se elimina os gastos com energia elétrica. Além disso, o excedente pode ser distribuído para os vizinhos. Outra vantagem é que as minihidrelétricas não causam impacto ambiental. Um pequeno desvio do curso da água é feito, mas depois da captação da água, a queda volta ao seu curso normal (leia box ao lado). A manutenção do equipamento é também mínima.

Itaipu

Ao cliente cabe apenas a parte civil, que é a preparação do local onde o maquinário será instalado. O eletrotécnico encomenda as peças e, então faz a montagem da turbina. "Fiz várias experiências até chegar ao ponto certo das turbinas", conta Hilário. Em seguida, ele instala toda a parte de tubulação por onde a energia será distribuída no ambiente. Algumas turbinas que Hilário montou possuem o mesmo sistema utilizado na usina hidrelétrica de Itaipu, a maior do mundo em geração de energia. As máquinas de Hilário estão espalhadas por Santa Catarina e até no Paraná. Em estados como Mato Grosso, onde muitas áreas ainda não têm energia elétrica, o serviço do gasparense foi requisitado. Ele só não atendeu ao pedido por conta da distância. "Tenho uma oficina de carros no Poço Grande e ainda trabalho lá, por isso não posso ficar muito tempo ausente", justifica. Em Gaspar, existe uma em funcionamento no bairro Barracão.

"Casa de ferreiro, espeto de pau". Apesar de já ter feito muitas minihidrelétricas, Hilário não tem a sua. Ele conta que, uma vez, montou uma na piscina de sua casa, mas durou pouco tempo. Agora, o inventor adquiriu um terreno no Macuco, que possui ribeirões e quedas d?água próprias para o seu invento. "Pretendo montar umas minihidrelétricas lá pra mim", garante.

Como tudo tem seus prós e contras, o custo é a maior barreira para a instalação de uma minihidrelétrica. O preço da turbina pode variar entre R$ 8 mil e R$ 20 mil, dependendo da necessidade do cliente, porém o custo maior, segundo Hilário, é o da tubulação, porém, ele alerta: "embora o investimento seja alto, o custo-benefício compensa".

Existem no Brasil 253 Pequenas Centrais Hidrelétricas em operação, somando 1.276.924 KW ao sistema interligado nacional, ou 1,35%. O estado com maior concentração de PCH é Minas Gerais, com 77 usinas.

 

Meio ambiente

As minihidrelétricas se configuram como uma boa alternativa de investimento no setor de obtenção de energia. Um dos principais fatores é que elas não causam impactos ambientais porque não necessitam de um reservatório de água. Apenas um desvio do curso, com uma pequena barragem, serve para o funcionamento do maquinário. A corrente é captada por um sistema de tomada d´água e, então, cai na câmara de carga. Dali, a água segue para a casa de máquinas, onde se encontra a turbina, que, através da rotação gerada pela queda d´água, produz a energia. A transmissão é feita por meio de linhas de distribuição. Por uma outra saída, a água utilizada pela hidrelétrica volta ao seu curso normal.

Hilário ensina ao neto noções de elétrica

Desde jovem, Hilário sempre gostou muito de estudar a parte da física que trata de hidráulica, apesar de ter se formado eletrotécnico, mais tarde. "Vi meu pai tentar fazer uma roda d?água funcionar, acho que foi aí que despertou meu interesse", diz. Da mesma forma, seu neto Luciano, de 8 anos, já procura aprender as técnicas do avô. Hilário conta que está ensinando para ele tudo o que sabe na parte elétrica.

O envolvimento do eletrotécnico com a hidráulica vai além das hidrelétricas. Ele trabalha muito também com uma máquina chamada carneiro hidráulico. Segundo Hilário, o equipamento possui um sistema capaz de fazer jorrar água sem nenhum motor. Ele pode ser instalado em qualquer leito de água corrente, desde que haja uma queda de, no mínimo, 1 metro de altura. Hilário já instalou um carneiro em Campos Novos, que joga água a 1.800 metros. O carneiro hidráulico tem seis tamanhos diferentes, e a capacidade varia. Hilário os compra prontos, de uma empresa de Curitiba, para instalar para alguns clientes. "Já pensei em fazer um maior, mas não consegui ainda", conta.

Apesar de gostar muito desta área, Hilário não pode dedicar-se muito a construção de minihidrelétricas e mesmo a instalação dos carneiros. Por enquanto, a atividade é encarada como um hobby, embora gere renda. Hilário é proprietário de uma oficina mecânica, onde trabalha com os filhos. Eles cuidam da parte mecânica, e ele da elétrica. "Pretendo deixar a oficina para eles e ficar só com o desenvolvimento de minihidrelétricas", planeja. Mesmo assim, ele não deixa de atender as encomendas. Para este ano, o inventor já tem dois novos projetos contratados.

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