Artista, polêmico e sem teto
Tadeu Bittencourt se prepara para voltar a produzir mesmo depois de ter a casa soterrada na enchente
Tadeu Bittencourt se prepara para voltar a produzir mesmo depois de ter a casa soterrada na enchente
Tadeu Bittencourt é um homem simples e de bem com a vida e a sua arte. Produziu diversas obras que vão desde o desenho, até a escultura e a cenografia. Hoje é um dos artistas plásticos mais premiados de Santa Catarina. Considerado polêmico, por uns, inovador por outros, ele participou de diversas exposições artísticas no Estado e no País. Tadeu chegou a organizar exposições em Gaspar, cidade que escolheu para morar há mais de 20 anos.
"Sou, sim, muito questionador, sou polêmico. E daí? Esse é o barato de ser artista", afirma. Em cada produção, ele busca um tema. Em seu último trabalho, intitulado "Os invisíveis", ele explorou o conceito de não figura, buscando o abstrato. Outra vez, fez trabalhos com canos, para discutir o sistema de esgoto das cidades.
O artista fez também obras flutuantes, com uma câmara de ar e bambu, para levantar as peças do chão. Até pirão ele já usou para fazer suas obras. É adepto da ideia de que tudo é ou pode virar arte. Ele conta que uma vez, pintou uma casa inteira de bolinhas. Como estava perto do Natal, explicou que era para comemorar a data. "Saí em todos os jornais do Estado, naquela vez", diverte-se.
Apesar da criatividade, o artista sente que suas obras ainda chocam as pessoas, por fugirem do tradicional. Por isso, considera a profissão de artista uma das mais difíceis. "Antes de tudo, a pessoa precisa provar que é artista e que o que faz é realmente arte", explica. Tadeu diz que em Gaspar não se tem muito incentivo para trabalhar, não há um espaço para se criar um movimento artístico. Ainda assim, ele considera que houve uma evolução nos incentivos à arte e à cultura, com a criação da Casa da Cultura Dagoberto Günther. Em Blumenau, cidade onde nasceu, também houve evolução, acredita o artista.
Tadeu já expôs suas obras em outros estados, como no aniversário da cidade de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, e até em um evento da Organização das Nações Unidas, no Paraná. Em seu currículo, contam-se 12 prêmios de salões de arte e outros 11 por seus trabalhos cenográficos. "Os prêmios são importantes para você ter seu trabalho reconhecido. Já foram muito legais, mas hoje eles não avaliam mais a obra, e sim a foto da obra. Isso prejudica um pouco os trabalhos", comenta o artista, que pretende voltar a expor em salões de arte. O local de trabalho de Tadeu era sua casa, no Gaspar Grande. Porém, durante a tragédia do ano passado, a casa foi soterrada. Todos os seus trabalhos foram perdidos (leia box).
O artista conseguiu salvar apenas fotos de algumas obras e hoje as estampa em camisetas para vender e se manter. Por enquanto, Tadeu não está mais trabalhando. Vai aguardar sua situação se resolver para voltar a produzir sua arte.
Tadeu e a esposa moram em um quarto alugado
Por volta das 15h do domingo, 23 de novembro do ano passado, o morro que ficava nos fundos da casa de Tadeu desabou. Tudo aconteceu em questão de segundos. Ele, a esposa e a sogra estavam na varanda, com os vizinhos da casa da frente. Eles haviam pedido abrigo para Tadeu, pois temiam que a terra desabasse sobre sua residência. Todo aquele outro lado da rua já havia apresentado sinais de desmoronamento.
Porém, o que realmente caiu, foi o lado onde morava o artista. A sua e outras duas casas foram completamente soterradas, e parte da casa do cunhado de Tadeu foi levada pelo barro. Algumas pessoas também foram soterradas, no primeiro deslizamento. "Foi o tempo de salvarmos quem estava debaixo da terra e corrermos, porque logo caiu mais um pouco", lembra Tadeu. À noite, veio a Defesa Civil e os levou a um abrigo. Ficaram lá uma semana. Aí, o artista pôde ver o quanto as pessoas são solidárias. "Fomos muito bem tratados".
Desde então, ele e a esposa moram em Blumenau, em um quarto que alugaram. Tadeu às vezes também se hospeda na casa de um irmão, ou outro, para não dar trabalho a ninguém. Os vizinhos voltaram para sua casa, que ficou intacta do outro lado da rua. Mas o risco continua. "Temos um laudo da Defesa Civil que diz que, se chover dois dias seguidos, temos que sair daqui", diz Nair Cordeiro.
Nair mora há 31 anos naquele local, e nunca viu acontecer algo parecido. Hoje, ela é uma das únicas que continua morando lá, com a família. A rua que sobe o morro está em condições precárias. Segundo ela, ninguém esteve ali para arrumar. "Nem o caminhão de lixo passa mais aqui", lamenta.
"Sou, sim, muito questionador, sou polêmico. E daí?" Tadeu Bittencourt